Impeachment será somente o fim de um capítulo da novela
O impeachment de Dilma Rousseff – agora algo mais do que provável, quase inevitável – está longe de encerrar a novela que se tornou a política brasileira. É o fim de um capítulo. Ou, talvez, de forma mais precisa, de parte importante da história. Um desfecho com toques dramáticos. Daqueles que merecem um tempo de reflexão, um tempo de respirar profundo antes de se prosseguir com a leitura. Mas a novela prossegue. E, se não perceberem os dirigentes políticos e a sociedade como um todo, ela prosseguirá com novos capítulos dramáticos e longe de chegar a um desfecho.
Nós já dissemos por aqui. Pode interessar a alguns grupos políticos vender a narrativa de que as investigações feitas pela Operação Lava-Jato se destinavam unicamente a apear do poder determinado partido e determinado grupo político. É até verdade que alguns dos atores envolvidos nessa trama comportam-se de forma política e partidária e que nem tudo nesse processo pode ser justificado simplesmente pela mera leitura das leis. Mas a Lava-Jato se trata de uma investigação sobre a forma como a política brasileira se financia. E sobre a forma como se relacionam na política brasileira financiadores e financiados.
E o que fica claro é que a Justiça brasileira não parece disposta a ter tolerância com essa forma. Assim, ou entendem isso os dirigentes políticos, ou entende isso a sociedade para pressionar pelas mudanças, ou o desfecho de cada capítulo dessa novela será na cela de alguma penitenciária do país. Será com a frustração de projetos políticos. Será com o prosseguimento e com o agravamento da crise política que se abate sobre o país.
Se a Operação Lava-Jato produziu os elementos necessários para o início do processo que agora culmina com o impeachment de Dilma, há nela também elementos que poderão atingir de forma mais ou menos graves os demais principais partidos e políticos brasileiros. Sergio Moro estudou profundamente a Operação Mãos Limpas da Itália, como também já falamos por aqui. Em 2004, em um artigo, ele já previa tudo o que faria se tivesse uma Operação Mãos Limpas para chamar de sua. Na Itália, a Mãos Limpas produziu uma profunda mudança em todo o panorama político do país. Não necessariamente para melhor, uma vez que gerou uma figura polêmica, no mínimo, como Silvio Berlusconi.
A reportagem do fim de semana da revista Veja, detalhando informações que podem vir de delações da Odebrecht, mostra o potencial da investigação contra o PMDB de Michel Temer. Não é a primeira vez que a Lava-Jato esbarra no PMDB. Um pouco depois do impeachment de Dilma, deverá ser a vez da também a essa altura inevitável cassação do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). E estão na investigação os elementos também contra o PSDB, desde a história de negociações feitas pelo falecido senador Sergio Guerra (PE), mas indo além disso. Até nas próprias informações oriundas da mesma Odebrecht.
E segue a balada, até mesmo fora dos focos da própria Lava-Jato. Uma fatalidade mostrou os mesmos sistemas acontecendo na campanha de Eduardo Campos no PSB. Não vai parar. Os diálogos gravados pelo ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, que derrubaram o senador Romero Jucá (PMDB-RR) da Casa Civil, mostram que os políticos mais experimentados, nas suas conversas reservadas, sabem disso.
Ou, melhor, pode parar. Nada indica que por algum acordo político – até agora não há qualquer evidência de que isso seja possível. Mas a partir da percepção de que é preciso mudar o sistema. E, aí, efetivamente começarmos a mudá-lo.