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Jucá, Moro e a Mãos Limpas tupiniquim


Nas conversas com o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, que fizeram com que o senador Romero Jucá (PMDB-RR) tirasse umas férias forçadas do Ministério do Planejamento que assumira há menos de 15 dias, uma das coisas que chama a atenção é a avaliação que ambos fazem de que a crise política motivada pela Operação Lava-Jato atinge a todos, indistintamente. Pegou primeiro o PT para avançar agora sobre o PMDB e depois engolfar o PSDB, onde, na avaliação de Jucá - que pode ser muita coisa menos inexperiente na política -, "o primeiro a ser comido" será o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

A verdade é que a toada de metralhadora giratória da Operação Lava-Jato só espanta a quem deixou sua visão ser embotada pelo espírito de torcida no FlaXFlu que se instalou na discussão política brasileira. Essa nunca foi uma crise apenas de determinados partidos ou de determinados grupos que estavam no poder. Foi sempre uma crise do sistema. Uma crise que questiona o modo de se fazer política, o modo como a política se financia. Por isso, não escolhe quem atinge. Pegou primeiro Dilma Rousseff e o PT porque eram eles que estavam no poder. Atinge agora Jucá e não vai parar nele.

Sérgio Machado fez em nível federal e com relação ao PMDB o que Durval Barbosa fez no nível de Brasília e com relação ao DEM na Operação Caixa de Pandora. Enrolado nas investigações, Machado fez um acordo de colaboração com a Justiça. Gravou Romero Jucá e já há informações de que teria gravado também o ex-senador José Sarney (PMDB-AP) e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Deve ter gravado outros. Essas gravações e outros detalhes da sua delação premiada provavelmente terão o mesmo efeito sobre o PMDB que as delações do ex-senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS) têm tido sobre o PT. Tanto Machado como Jucá, antes de pertencerem ao PMDB, foram do PSDB. E lá nas gravações comentam: "Todo mundo sabe como era o esquema do Aécio". E mais dizem: já "caiu a ficha" da cúpula tucana com relação a isso.

Ambos imaginavam, pelo que se deduz da conversa, que o afastamento de Dilma poderia provocar um estancamento da Lava-Jato. Ao que parece, também acabaram eles embotados pelo espírito de torcida. Deveriam ter lido com mais atenção o artigo que o juiz Sergio Moro escreveu em 2004 - há doze anos! - sobre a Operação Mãos Limpas, que demoliu a máfia e suas ligações com a política na Itália. Ali, fica clara a adoração de Moro pela operação italiana, que considera o ápice da condução da Justiça em qualquer tempo ou país. "Momento extraordinário na história contemporânea do Judiciário", escreve ele. Fica claro que Moro já naquela ocasião sonhava com uma Operação Mãos Limpas para chamar de sua. Para imitá-la por aqui em cada detalhe. E para obter exatamente por aqui os mesmos resultados.

No ano passado, escrevi sobre esse artigo de Moro e sobre como ela já antecipava cada passo do que o juiz paranaense faz agora na Operação Lava-Jato. Repito um pouco agora o que escrevi daquela vez, pela sua relevância e porque muitos não devem ter lido o artigo anterior. Moro só chama a operação italiana pelo seu nome original, "Manu Pulite". Lá na Itália, a Operação Mãos Limpas primeiro defenestrou o líder de esquerda, o ex-primeiro ministro Betino Craxi, e demoliu seu partido, o Partido Socialista Italiano (PSI). Em seguida, igualmente pegou o conservador Giulio Andreotti e da mesma forma detonou seu partido, o Democrata Cristão. Qualquer semelhança... "Talvez não se encontre paralelo de ação judiciária com efeitos tão incisivos na vida institucional de um país", escreveu, há doze anos, Sergio Moro.

Está no artigo de Moro, inteira, a menção ao uso da delação premiada para obter as provas necessárias na investigação. “A estratégia de investigação adotada desde o início do inquérito submetia os suspeitos à pressão de tomar decisão quanto a confessar, espalhando a suspeita de que outros já teriam confessado e levantando a perspectiva de permanência na prisão pelo menos pelo período da custódia preventiva no caso da manutenção do silêncio ou, vice-versa, de soltura imediata no caso de uma confissão”, escreve.

Está também o uso do vazamento para a imprensa como forma de obter pressão popular para que a investigação não pare. "Para o desgosto dos líderes do PSI, que, por certo, nunca pararam de manipular a imprensa, a investigação da mani pulite vazava como uma peneira. A publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento da massa de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações. Mais importante: garantiu o apoio da opinião pública às ações judiciais, impedindo que as figuras públicas investigadas obstruíssem o trabalho dos magistrados, o que, como visto, foi de fato tentado”.

Moro sabe - e pondera sobre isso em seu artigo - que, no caso da Itália, a destruição dos partidos políticos tradicionais fez nascer um outro grupo político igualmente controverso, capitaneado pelo empresário Silvio Berlusconi. Mas há doze anos ele já achava que reproduzi-la por aqui poderia causar, na sua visão, um caráter salutar. “No Brasil, encontram-se presentes várias das condições institucionais necessárias para a realização de ação judicial semelhante. Assim como na Itália, a classe política não goza de grande prestígio junto à população, sendo grande a frustração pelas promessas não cumpridas após a restauração democrática".

Ao por as mãos nos conteúdos iniciais da Lava-Jato, Moro vislumbrou a possibilidade de repetir a Mãos Limpas. E os efeitos reais disso são a base principal de toda a conversa entre Romero Jucá e Sérgio Machado. Menos de 15 dias depois de tomar posse, o presidente interino Michel Temer vê-se sentado em frigideira de quentura semelhante à que fustigava Dilma. A coisa, ao que tudo indica, não vai parar.


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