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Política, é mais fácil no atacado


Efeito colateral importante da eleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) para a presidência da Câmara foi o esvaziamento do chamado Centrão, o grupo de deputados de partidos menores que vinha ameaçando tomar o poder no Legislativo durante a era Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Ainda que talvez a ideia do novo Centrão em princípio fosse outra, impossível não lembrar do primeiro Centrão, que surgiu durante os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte. Liderado pelo ex-deputado Roberto Cardoso Alves, o Centrão da Constituinte foi um grupo que se aliou a José Sarney na época para fazer reverter pontos da Constituição que desagradavam ao ex-presidente e outros que eram considerados muito progressistas pelos grupos mais conservadores. O Centrão da época trabalhou para diminuir pontos relacionados à reforma agrária, a conquistas sociais, e ajudou a evitar que o mandato de Sarney fosse reduzido de seis anos para quatro anos (ficou numa posição intermediária de cinco anos, por isso tivemos uma eleição isolada para presidente em 1989, na sua sucessão). Para conseguir os seus intentos, Sarney distribuiu a rodo concessões para emissoras de rádio e outras benesses. E a máxima do Centrão da época foi uma distorção fisiológica do verso da oração de São Francisco feita por Cardoso Alves: “É dando que se recebe”.

O Centrão de Eduardo Cunha teve realmente semelhanças com seu antecessor “franciscano”. Com o apoio do grupo, Cunha impôs no seu período da mesma forma uma pauta de temas conservadores, principalmente relacionados a questões de comportamento. Mas, principalmente, o novo Centrão tornava bem mais complicadas as relações políticas entre Executivo e Legislativo. Por ser um grupo heterogêneo dentro de vários partidos, não necessariamente vinculado aos seus líderes formais, o Centrão obrigava a formação de alianças bem mais complicadas, negociações quase que isoladas, um a um, com os parlamentares. Uma negociação no varejo.

A eleição de Rodrigo Maia traz de volta a configuração mais tradicional da negociação política, na qual as conversas e definições são feitas pelo colégio de líderes. Ou seja: política no atacado. O que costuma ser geralmente mais fácil. Na barafunda do nosso sistema político, ela nunca se dará integralmente. Nossos partidos não têm unidade ideológica, as filiações são por conveniência local, e nem todo mundo segue a orientação determinada pelos líderes. Mas, diminuído o poder de grupos heterogênos como o Centrão, fica mais garantido o retorno dessa política no atacado. Um modelo que interessa principalmente aos maiores partidos. Por isso, eles acabaram se unindo em torno da eleição de Rodrigo Maia.

O Centrão acabou sendo o incômodo Frankenstein gerado por um modelo que começou no início do governo Lula na relação que gerou o mensalão. Antes mesmo de tomar posse, quando Lula começou a definir as suas alianças. O então presidente desautorizou seu futuro ministro da Casa Civil, José Dirceu, a continuar as negociações que vinha fazendo para levar o PMDB para a base do governo. O PMDB, vale lembrar, apoiou oficialmente a candidatura de José Serra, do PSDB, em 2002. Uma parte do partido, cujo expoente foi José Sarney, no entanto, apoiou Lula. Naquele momento antes da posse, Dirceu tratava de levar os peemedebistas para a base. O partido já era comandado pelo hoje presidente interino Michel Temer. Lula preferiu barrar as negociações. Achou que seria mais fácil negociar apoios no varejo com os grupos de Sarney, do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e outros aliados. A gênese dessa negociação no varejo, avaliam muitos, deu no mensalão.

Quase sempre, essa opção pelo varejo nos últimos tempos teve como objetivo dividir o PMDB, na curiosa forma como esse partido optou por fazer política no país: não tem candidatos na eleição presidencial, lança iscas para os dois grupos mais fortes na disputa e depois torna-se necessário pelo tamanho que tem, vital para a formação de uma maioria no Congresso. Foi assim quando se estimulou a criação do PSD, então do prefeito paulista Gilberto Kassab. Foi assim quando o então vice-presidente José Alencar criou o PRB, unido aos evangélicos especialmente da Igreja Universal do Reino de Deus.

Se essa opção pelo varejo já se mostra, porém, complicada para pessoas que revelam maior gosto pelo jogo político – casos de Lula e Michel Temer –, ela vira totalmente desastrosa se o presidente é alguém totalmente desprovido de jogo de cintura, como Dilma Rousseff. Comandado por um adversário confesso, Eduardo Cunha, o Centrão transformou a vida de Dilma num inferno. Impôs a pauta no Congresso e conferiu diversas derrotas ao governo. Sai agora de cena. Isso não garante tranquilidade ao governo, porque tranquilidade – com as investigações da Lava-Jato, a crise econômica e tudo o mais que nos assola – não é a palavra do momento. Em tese, porém, política no atacado costuma ser mais fácil que no varejo.


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