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In Cunha, do you trust?


Não durou 24 horas a bravata de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) de que na segunda-feira (23) retomaria seu gabinete na Câmara dos Deputados e lá poderia ser encontrado. Um dia depois de declarar isso ao final do seu depoimento na Comissão de Ética, Cunha recuou, dizendo que iria consultar seus advogados para não cometer nenhuma irregularidade. O recuo de Cunha pode ser o sinal de que a ficha começou a cair para ele. Fora da Câmara, Cunha perdeu os instrumentos de poder que tinha. E começa a descobrir que, sem eles, a manutenção do seu ousado - para dizer o mínimo - estilo de fazer as coisas começa a ser um pouco mais improvável.

O depoimento de Cunha não entusiasmou mesmo os seus mais fieis aliados. As questões que se avolumam permaneceram sem maiores explicações. A história de que não tem conta bancária na Suíça, mas, sim, um trust, soa no mínimo difícil de compreender. Parece querer sustentar sua defesa numa filigrana, num detalhe. Meio como dizer que negara quando perguntado se tinha um carro na Suíça porque, na verdade, ele tinha lá uma caminhonete.

Ele vai tentando estender seu processo ao máximo, quando fez até agora. É o processo de cassação mais longo da história do Parlamento. Tentou de novo ao questionar a indicação do deputado Marcos Rogério (DEM-RO) como relator do seu processo por ele pertencer agora a um bloco aliado ao PMDB, seu partido. Até os pombos do pombal ali ao lado do Congresso, na Praça dos Três Poderes, sabem que o bloco entre o DEM e o PMDB foi formado agora, no início do governo interino de Michel Temer, depois, portanto, do início do processo de cassação de Cunha.

Cunha é dono de uma inteligência rara. E de um raro conhecimento do Regimento Interno da Câmara dos Deputados. E é disso que vem se valendo até agora. São atributos que podem continuar lhe valendo. Mas parece ficar a cada dia mais complicada a sua situação. A atual crise - escrevi uma vez - é pingue-pongue: num momento, ela atinge Dilma e o PT; no momento seguinte, atinge Eduardo Cunha e outros adversários de Dilma e do PT. Porque não é uma crise de um partido apenas; muito menos de uma pessoa apenas; é uma crise do sistema.

No caso específico de Cunha, há um fator contra ele que remete ao seu estilo extremamente agressivo de fazer política. Esta semana, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), fez uma referência a isso ao dizer que Cunha parecia ter uma estranha fixação nele. No depoimento na Comissão de Ética, Cunha cobrara porque seu processo na Justiça corre célere e o de Renan praticamente nada anda. Afora detalhes mais ou menos agravantes da acusação, o que acontece é que Cunha pode ser vítima do seu estilo, enquanto Renan, mais sereno, conciliador e habilidoso nos bastidores, beneficia-se do seu.

A história mostra diversos casos de políticos que sucumbiram muito em razão do seu estilo, e não apenas pelo que fizeram. No escândalo dos anões do Orçamento, o deputado Ricardo Fiúza (PFL-PE) escapou, embora fosse acusado pelo denunciante, José Carlos Alves dos Santos, de só perder em envolvimento no esquema para o anão João Alves. E Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), sobre quem só haviam acusações mais enviesadas, acabou cassado. Muitos disseram ter sido uma vingança de deputados do baixo clero ressentidos com o estilo de Ibsen quando presidira a Câmara. No Senado, Luiz Estevão (PMDB-DF) também pode ter sido em boa parte cassado menos pelos desvios na obra do TRT de São Paulo e mais por seu perfil arrogante que incomodava a seus colegas. É semelhante o que se houve sobre o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. E mesmo sobre Dilma Rousseff. A motivação de muitos dos que se posicionaram pelo seu impeachment na Câmara e na primeira votação no Senado parece ter sido muito mais a lembrança de certas palavras ríspidas, distantes ou frias da presidente afastada do que propriamente sua responsabilidade direta nas pedaladas fiscais.

Ao contrário de muitos dos citados acima, Cunha tem ao seu lado uma tropa de choque - formada especialmente na turma do Baixo Clero - fiel. Mas também tem muitos inimigos feridos deixados pelo caminho. Tanto entre deputados mas também no corpo funcional da Câmara. E como esse corpo funcional pode ser perigoso!

De trust em trust, ele vê se reduzirem as chances de convencimento das suas explicações. Na crise pingue-pongue, a bola agora está com ele.


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